Por Marly Parra 17 de fevereiro 2022
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Presente nos cinco continentes, além de possuir mais de 30 mil colaboradores,  Grupo Stefanini pretende realizar o IPO em breve 

mais de três décadas no mercado de tecnologia, a multinacional brasileira Stefanini, que está presente em 41 países e possui 72 escritórios espalhados pelo mundo, surgiu em um momento difícil para a economia brasileira, devido ao Plano Collor nos anos 90. 

No Por Dentro das Empresas de hoje, você conhecerá a história de Marco Stefanini, que deixou de ser geólogo para mergulhar no universo da tecnologia da informação, e se tornou CEO Global do Grupo Stefanini – a empresa faturou R$5 bilhões somente em 2021 e pretende realizar o IPO em breve.

Abaixo, confira a entrevista de Marly Parra, conselheira da iHUB Investimentos, com Stefanini. 

1) A multinacional começou em um momento difícil no mercado com a crise da década de 90, por conta do Plano Collor. Como você se reinventou nesse período e qual o diferencial da empresa para esse sucesso todo?

A história do Grupo Stefanini, que em 2022 completa 35 anos, se confunde com a história recente do Brasil. O nascimento da empresa foi resultado da minha mudança de área, motivada indiretamente por uma crise econômica nacional. 

Créditos: Marco Stefanini, CEO Global do Grupo Stefanini

Embora tenha me formado em Geologia, pela USP, trabalhei pouco tempo nessa área. Após a experiência de um mês em uma mina de cassiterita no interior de Goiás, decidi que este não era o caminho que buscava, embora adorasse a profissão. 

A dificuldade de encontrar emprego em São Paulo fez com que eu migrasse para a área de tecnologia, incentivado pela minha irmã, que naquela época já trabalhava no Serpro. 

Realizei um curso de Análise de Sistemas e comecei a trabalhar na área de T.I do  Bradesco, onde aprendi muito, me especializei em programação, consultoria e ganhei confiança para abrir o meu próprio negócio, quando tinha apenas 26 anos. 

Como também dava aulas naquela época, tinha facilidade para atuar na área de treinamento, habilidade que contribuiu para conquistar os primeiros projetos. Mas, veio a crise causada pelo Plano Collor, no início dos anos 90, que levou ao cancelamento de vários contratos. 

Na época, a empresa funcionava na sala da minha casa e precisei me reinventar, com o apoio da minha esposa, para não fechar o negócio. Além de treinamentos, ampliamos a oferta de serviços de TI e consultoria. 

Assumimos vários riscos e aprendemos a identificar oportunidades, mesmo em cenários desafiadores. Hoje, posso afirmar que os importantes saltos de crescimento da empresa aconteceram nos períodos mais críticos da economia brasileira – do Plano Collor à situação pandêmica que ainda enfrentamos. 

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2) Com o seu espírito empreendedor e desbravador, a Stefanini cresceu muito nestes 34 anos, de forma orgânica, e com aquisições, se internacionalizou e hoje é uma multinacional brasileira, presente em 41 países e mais de 20 empresas com soluções avançadas. Quando deu o click e você começou a pensar grande, além de realizar a virada do jogo? 

Quando a empresa completou 30 anos, em 2017, constatamos que era preciso nos reinventarmos para continuar sendo uma das protagonistas do movimento de transformação digital em curso em todo o mundo e na Stefanini desde 2012. 

Consequentemente, o novo agir – mais conectado, colaborativo e com o objetivo de melhorar a experiência do cliente – precisava ser impresso em um novo propósito que passasse essa mensagem aos funcionários espalhados em todos os continentes. 

Créditos: colaboradores do Grupo Stefanini no escritório em Pinheiros (SP).
*Foto tirada antes da pandemia

O desafio era imenso: traduzir em poucas palavras o atual momento da companhia com o advento de novas tecnologias — como analytics, inteligência artificial e internet das coisas —, além de destacar a importância da parceria com os clientes. 

Antes de definir um novo propósito, a Stefanini precisava definir novos valores e crenças que dessem conta da transformação organizacional que já estava em curso e que viria a se intensificar. 

Isso era importante, pois a mudança dos preceitos dos líderes levaria a uma mudança de comportamento dessas mesmas lideranças, o que acabaria por influenciar a cultura da empresa como um todo e modificando a conduta dos colaboradores. 

Os novos valores tinham que levar em consideração uma perspectiva de longo prazo e precisavam ter como ponto de partida princípios-chave como, responsabilidade, produtividade e comunicação aberta. 

O intuito era atingir maior consciência sobre os serviços prestados, promover maior coesão interna, aumentar a autoestima dos funcionários e melhorar o relacionamento. Em outras palavras, fazer a diferença.

Efetivamente, essa transformação de valores começou com o envio de uma pesquisa elaborada pela Barrett Value Centre para 500 lideranças da Stefanini, que foram convidadas a selecionar dez valores / comportamentos pessoais, dez preceitos que melhor descreviam como a empresa operava até aquele momento, e dez convicções importantes para a nova cultura organizacional que levariam a Stefanini a um patamar mais elevado. 

Cada lista tinha 100 princípios como, adaptabilidade, excelência, pensamento holístico e igualdade. Os resultados foram compilados e organizados pela equipe de Gente e Cultura, de modo a mostrar um quadro de “quem somos, onde trabalhamos e onde queremos trabalhar”. 

A meta era envolver as principais lideranças da Stefanini na definição de um novo propósito alinhado ao novo posicionamento da empresa – que passou de prestadora de serviços de TI para integradora de soluções inovadoras como, analytics, core bancário com plataforma digital, cloud, inteligência artificial, IoT, marketing digital e segurança cibernética, de modo a auxiliar os clientes na transição para o mundo digital. 

Era importante, portanto, elaborar um novo preceito mais condizente com as ações já em curso pela companhia. Foi assim que chegamos ao novo propósito: cocriando soluções para um futuro melhor.

A definição de um novo propósito coincidiu com o período em que colocamos o pé no acelerador para realizar novas aquisições e joint-ventures, ampliando o nosso ecossistema digital. Atualmente, temos quase 30 empresas em diferentes áreas de atuação que compõem a divisão de negócios Stefanini Ventures. Especializadas em soluções digitais, as empresas estão divididas em seis plataformas: Analytics e IA, Banking, Cibersegurança, Indústria, Marketing Digital e Tecnologia. 

Só em 2020, o Grupo Stefanini adquiriu seis empresas, entre elas a holding Haus, dona da agência W3haus (marketing digital), e duas unidades de software da Diebold – Online Fraud Detection (OFD) e ServCore. 

No ano passado, adquirimos 100% da peruana Sapia e 60% do Grupo CRK. Na primeira semana deste ano foi a vez da Cobiscorp, empresa de software bancário com sede nos Estados Unidos, que estabeleceu uma base importante de clientes na América do Sul, composta por bancos na Argentina, Bolívia, Colômbia, Equador, Guatemala, México e Panamá. Tanto a CRK quanto a Cobiscorp foram incorporadas ao grupo por meio da Topaz, empresa especializada em soluções financeiras e uma das que mais cresceram nos últimos dois anos.

Créditos: Grupo Stefanini 

3) Explique sobre o desafio de administrar escritórios em tantos países e equipes de culturas diferentes.  

Temos uma equipe de Gente e Cultura que atua fortemente nas quatro regiões onde estamos: Brasil, Latam (países de língua espanhola), Estados Unidos/Ásia e EMEA, com o objetivo de entender necessidades específicas e principais expectativas. 

Somos uma empresa grande com visão de startup, que trabalha no formato de células. As lideranças têm autonomia para tomar decisões alinhadas com os objetivos de negócios dos clientes e do próprio grupo. 

Com a definição do novo propósito da empresa, promovemos uma mudança de mindset que começou pelas lideranças, de forma que pudessem estender às equipes, gerando engajamento e senso de pertencimento ao Grupo Stefanini, considerado um dos mais inovadores do país em várias premiações.

Quando a pandemia chegou ao Brasil e tivemos que transferir mais 90% dos funcionários para o home office, lançamos o projeto “Stefanini Everywhere”, que incentiva a contratação de talentos em qualquer lugar do país, mesmo que não haja escritório na cidade de origem do candidato, trabalhando com três modelos: um de home office total, parcial e um de flexibilidade em relação a horários.

A ideia é ser mais flexível e inclusivo, até porque há colaboradores que não se adaptam ao trabalho remoto e querem manter o formato tradicional, mantendo todas as medidas de segurança necessárias ao atual momento. 

Antes da pandemia, tínhamos colaboradores que residiam em 480 cidades e, hoje, já chegamos à marca de mais de 700 cidades somente no Brasil. Temos cerca de 3 mil colaboradores a mais e um faturamento 20% maior no grupo desde o início da pandemia. Uma combinação de talentos com diferentes olhares e de uma gestão que se preocupa com as pessoas. 

Créditos: Grupo Stefanini 

4) Atualmente, o Grupo Stefanini  tem cerca de 30 mil funcionários no mundo. Como é administrar o  custo de gestão com profissionais em países e economias tão diferentes? 

Contamos com um time de diretores financeiros que cuida da gestão dos profissionais em cada uma das regiões onde atuamos, além da Stefanini Ventures, que é a nossa divisão de negócios focada em soluções digitais e uma das que mais cresceram nos últimos dois anos. 

Existe um alinhamento entre eles para que os melhores modelos de gestão sejam replicados, respeitando a economia e a cultura de países tão diferentes. Certamente o Brasil é um dos mais complexos, considerando a carga tributária e os impactos do aumento da inflação acima de 10%.

5) Os clientes valorizam uma empresa de tecnologia brasileira? Além disso, a concorrência é grande nos países que o grupo está presente? 

Competimos com grandes players no mundo inteiro. O início do processo de internacionalização foi mais difícil, pois era preciso que a empresa se tornasse conhecida ao chegar em um novo país. 

Mas, a qualidade das soluções e dos serviços apresentados pela companhia, muitas vezes evidenciados pelos resultados compartilhados pelos próprios clientes, alavancaram nossos negócios no exterior. 

As aquisições que realizamos na América Latina e nos Estados Unidos também contribuíram para mostrar o grau de maturidade da companhia e a expertise de seus profissionais. 

Gosto de salientar que os profissionais de tecnologia do Brasil estão entre os melhores do mundo. Além da competência técnica, são mais flexíveis para entender a necessidade dos clientes e apresentar soluções que resolvam os problemas. 

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6) Hoje a Stefanini é uma empresa de tecnologia de soluções digitais e opera em diversos setores e segmentos de mercado, isto faz com que a empresa dilua os riscos? 

Mais do que diluir riscos, operar em diversos setores do mercado nos posiciona como líderes em inovação e como um player capaz de entregar soluções fim a fim. Além de finanças, onde temos uma grande atuação, continuam em evidência áreas voltadas para Tecnologia, Varejo, Saúde, Marketing Digital, Cloud, Manufatura/Indústria 4.0, Cibersegurança, Inteligência Artificial e Dados. 

Assim como atuar em vários países, o fato de diversificar as ofertas faz com que não coloquemos os ovos na mesma cesta. Se eventualmente a demanda por uma solução e a economia de um país não vão tão bem, as outras ajudam a equilibrar a cesta. 

7) Se a Stefanini abrisse o capital hoje, qual seria o seu diferencial para o investidor? 

O fato de ser uma empresa salutar, sustentável, praticamente sem dívidas, com crescimento anual acima de 20% e alto NPS. A reputação que conquistamos ao longo de 34 anos, com uma política de governança robusta, certamente nos coloca numa posição privilegiada. 

A Stefanini se transformou para ajudar os clientes em seus processos de transformação digital. A decisão de mudar o mindset e se reinventar é outro diferencial que chancela o grupo como referência no mercado de tecnologia e soluções digitais.

Além disso, é uma multinacional brasileira presente em 41 países e considerada a quinta mais internacionalizada, segundo o Ranking da Fundação Dom Cabral, sendo a primeira do setor. Além do faturamento, o aumento das margens e do Ebitda fariam brilhar os olhos dos investidores.

  Créditos: Grupo Stefanini 

8) Como você enxerga a Stefanini do futuro com tanta disruptura no mercado? 

A Stefanini já é o futuro. Ao investir em inovação nos últimos dez anos, a empresa assume riscos e, apesar do tamanho, reiterou seu perfil empreendedor e sua capacidade de fazer diferente, sempre de olho no que o cliente precisa. 

Tivemos que desaprender algumas vezes para aprender mais e acompanhar a disruptura que o mercado exige. Todo esse processo demandou  esforço, dedicação, dinheiro, humildade e muito aprendizado. O caminho está pavimentado para que possamos continuar crescendo rumo ao futuro disruptivo e cada vez mais complexo.