Por que até os mortos investem melhor: o paradoxo da inatividade

Imagine um investidor que não lê jornais, não acompanha o mercado e nunca abre o home broker. Agora imagine que esse investidor está… morto. Pode parecer uma piada de mau gosto, mas é exatamente isso que uma grande corretora americana descobriu ao analisar anos de rentabilidade de seus clientes: os melhores desempenhos vinham, em sua maioria, de contas esquecidas — ou de pessoas falecidas.
Essas carteiras não reagiam ao noticiário, não vendiam em pânico nem compravam na euforia. Estavam simplesmente… quietas. Imunes ao bombardeio de manchetes, ciclos de hype, previsões falhas e conselhos apressados. Enquanto o investidor médio tropeçava tentando “adiantar o mercado”, esses inativos colhiam os frutos da constância.
A ilusão da ação e o custo de se mexer demais
Nos investimentos, quem muito se mexe, tropeça. A movimentação excessiva é quase sempre impulsiva — guiada por medo, ganância ou comparação com o “vizinho”. É a eterna angústia de ver um ativo subir sem você, ou cair enquanto você segura. E isso nos torna vulneráveis a um dos maiores sabotadores de performance: o excesso de atividade.
Estudos da Vanguard, Fidelity e até da CVM brasileira indicam que o investidor que opera demais tende a ter desempenho inferior ao que simplesmente mantém sua estratégia ao longo do tempo. A cada clique, o cérebro ativa os circuitos de dopamina — reforçando o vício comportamental, como se fosse um jogo de azar. E é exatamente isso que acontece no Day Trade.
Day Trade: o cassino da autoconfiança
Na teoria, o day trade parece uma arena de habilidade e técnica. Na prática, é mais próximo de uma roleta de cassino. Estimativas da CVM apontam que mais de 90% dos day traders têm prejuízo no longo prazo. E mesmo entre os poucos que ganham, quase ninguém mantém a consistência.
A razão é simples: o day trade exige um nível de autocontrole emocional que poucos têm. Um gráfico vermelho ativa o medo. Um pico de alta, a euforia. O trade perfeito de um conhecido gera inveja. A perda do dia anterior gera sede de revanche. E tudo isso antes mesmo da racionalização entrar em cena.
Como se não bastasse, muitos investidores são seduzidos pela sorte de principiante: começam ganhando e acreditam que têm um dom especial. Operam mais, aumentam a mão, se arriscam — até que a realidade cobra sua conta. O mercado pune a arrogância com frieza implacável.
O excesso de informação e o efeito manada
Vivemos em um ambiente de estímulos constantes. Notícias negativas têm mais apelo emocional — são compartilhadas com mais velocidade, causam mais cliques, geram mais medo. E esse medo nos leva a agir. Mas não necessariamente a agir certo.
Além disso, há outro problema: a abundância de opções. Com tantos produtos financeiros disponíveis, estratégias possíveis e fontes de informação conflitantes, ficamos com a sensação constante de que estamos sempre perdendo alguma coisa. O efeito é o mesmo descrito por Barry Schwartz no “Paradoxo da Escolha”: mais alternativas não nos empoderam — nos paralisam.
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Esse ambiente favorece o efeito manada. Ouvimos que tal ativo “está bombando” e nos sentimos impelidos a comprar. Vemos outros vendendo e corremos atrás. Mas o comportamento coletivo, quando irracional, é o caminho mais rápido para a destruição de valor.
A lição final: disciplina, não genialidade
O maior erro dos investidores não está em escolher maus ativos — está em agir demais. Não é falta de inteligência. É falta de paciência. E talvez por isso os mortos ganhem mais: porque não atrapalham seus próprios investimentos.
Investir é sobre ter uma estratégia sólida e saber quando não fazer nada. É sobre resistir ao impulso, cultivar a constância e entender que o tempo é um aliado mais poderoso do que qualquer previsão.
Como disse Warren Buffett:
“O mercado é um mecanismo de transferência de dinheiro dos impacientes para os pacientes.”
E, às vezes, a paciência vem de onde menos se espera — até de quem já não está mais aqui.