A corrida pelos dividendos e o imposto que ainda nem começou
A antecipação histórica de proventos e como a taxação de dividendos já está transformando o mercado brasileiro.
Edição #015
Faltando pouco mais de um mês para o fim de 2025, o mercado brasileiro vive uma corrida atípica para distribuir lucros antes que o novo imposto sobre dividendos entre em vigor em 2026. O efeito foi imediato: empresas antecipando proventos, investidores correndo atrás de datas de corte e o Ibovespa renovando máximas, impulsionado justamente por essa onda de distribuições agressivas.
Segundo levantamento da InfoMoney, dezembro será um dos meses mais generosos da história recente: Petrobras, Axia Energia e Cury estão entre as companhias que anunciaram pagamentos expressivos de dividendos e juros sobre capital próprio, numa tentativa de antecipar-se à alíquota adicional de 10% que passará a ser cobrada a partir de 2026.
O imposto que está chegando…
A nova tributação sobre dividendos, proposta como parte da reforma do Imposto de Renda, pretende taxar em 10% os rendimentos distribuídos a pessoas físicas, algo inédito desde 1995. Embora a medida só passe a valer no próximo exercício, seu impacto já é visível.
Empresas que tradicionalmente distribuem lucros acima da média estão acelerando pagamentos ou criando mecanismos alternativos para preservar valor aos acionistas. A Axia Energia, por exemplo, anunciou uma estrutura de ações resgatáveis, uma solução engenhosa para transformar dividendos em devoluções de capital, contornando legalmente o novo imposto. Outras companhias estudam modelos parecidos, sinalizando que a criatividade tributária voltou a ser uma vantagem competitiva no Brasil.
Por que o Ibovespa disparou?
Esse movimento de antecipação criou um fenômeno curioso: enquanto o mundo discute desaceleração econômica, o Ibovespa sobe forte, consolidando-se como a melhor aplicação do ano. A explicação é simples: investidores estão correndo para capturar dividendos e reprecificando empresas com políticas de distribuição robustas, especialmente nos setores de energia, commodities e financeiro.

Além disso, com a bolha de tecnologia nos EUA gerando dúvidas e o dólar globalmente mais fraco, parte do capital estrangeiro encontrou no Brasil uma oportunidade de curto prazo: renda alta, câmbio estável e um bônus fiscal antes da virada de regra.
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Mas o entusiasmo, como sempre, precisa de contexto. O que o mercado vive agora é, em parte, um efeito de antecipação, uma valorização impulsionada por algo que, ironicamente, reduz o potencial de lucro futuro. Quando as empresas pagam mais dividendos hoje, ficam com menos fôlego para reinvestir amanhã.
O que vem pela frente:
A partir de 2026, o jogo muda. A tributação de dividendos tende a:
• Aumentar a atratividade dos fundos de investimento e estruturas de previdência, que seguirão com isenções parciais;
• Reduzir a vantagem das empresas boas pagadoras de dividendos, deslocando parte do interesse para companhias de crescimento, ou, limitar distribuições futuras no modelo tradicional
• Incentivar reorganizações societárias, fusões e novos formatos de distribuição de lucros (como as ações resgatáveis ou bonificações especiais).
• Aumentar a demanda pelos isentos: LCIs, LCAs, CRIs, CRAs e Debentures Incentivadas não entram na soma de rendimentos, portanto devem passar a ganhar ainda mais peso em muitos portfólios.
Para o investidor, isso significa uma coisa: a eficiência fiscal volta ao centro da estratégia. Não basta buscar a maior taxa ou o maior dividendo, é preciso entender o efeito líquido do imposto sobre o resultado real da carteira.
A corrida atual por dividendos é, no fundo, um reflexo de algo maior: a necessidade de planejamento. Muitos investidores ainda tomam decisões baseadas apenas na rentabilidade bruta, sem considerar o impacto tributário. E, no fim, pagam caro por isso.
Em 2026, o imposto chega. Mas o impacto dele já começou. Mais do que nunca, vale revisar se o seu portfólio e o seu assessor estão preparados para um mercado onde até o lucro precisa de estratégia.
O investidor consciente sabe que não é quanto se ganha que define o sucesso, é quanto se mantém
Nos vemos na próxima edição.
— Paulo Cunha